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SARS-Cov-2 NAS ESTRUTURAS RESIDENCIAIS PARA IDOSOS: O QUE NOS MOSTRA?



A pandemia causada pelo novo coronavírus fez mergulhar o mundo num caos sem precedentes, obrigando à tomada de medias especialmente excecionais. Pandemia essa que trouxe ao de cima o melhor e o pior do ser humano e tornou visíveis problemas e fragilidades que sempre existiram e que agora se agudizam, nomeadamente naquilo que tem de ver com um coletivo de pessoas cada vez maior, as pessoas que experienciam a velhice. Esta realidade faz-nos lembrar que existem muitas pessoas idosas, apela-nos a considerar quão poucas são as respostas sociais dedicadas às potencialidades e necessidades destas pessoas e desperta-nos (“só agora”) para o facto de existirem autênticos heróis e heroínas profundamente comprometidos com o bem-estar e dignidade das pessoas mais velhas. Recordo, porém, que as pessoas idosas sempre existiram (efetivamente em menor número do daquele existente nas sociedades contemporâneas, resultado, entre outros, da diminuição numérica das classes etárias mais jovens), que as respostas sociais sempre foram fundamentais (efetivamente em número reduzido face às exigências das sociedades atuais), e que heróis sempre existiram ligados à causa do Envelhecimento Ativo e Saudável e da velhice.


Observa-se que o cenário atual leva a uma preocupação maior das autoridades de saúde junto das Estruturas Residenciais para Idosos (ERPI) no que respeita ao contágio por COVID-19, na medida em que há um conjunto de dados que evidenciam de forma muito particular como este novo coronavírus afeta a população mais envelhecida.


Em todo o país multiplicam-se as notícias de idosos e trabalhadores em ERPI infetados, pelo que deve merece um sublinhado especial as respostas sociais desta natureza.


Face a este fenómeno, a temática relacionada com as pessoas que experienciam a fase mais tardia da vida têm sido, pelas piores razões, notas de abertura dos principais jornais, posições extremadas e profundamente irrefletidas de dirigentes de alguns grupos profissionais, temas de conversas e preocupação geral da comunidade. Carece de se atender que a provisão do cuidado às pessoas idosas são nota de destaque de forma transversal pela maneira como foram/são desenhados e operacionalizados os Planos de Contingência em estruturas residenciais.


Neste contexto, de entre outros, o COVID-19 contribuiu para dar visibilidade a uma “realidade escondida”, ou que alguns não queriam ver/ou não faziam questão de vislumbrar.


DEMOGRAFIA

(1) A demografia densa e envelhecida: Portugal é um dos 5 países mais híper envelhecidos do mundo. Se em Portugal, no ano de 1971 existiam, 836.058 pessoas com 65 e mais anos, em 2018 o número de idosos situou-se nos 2.244.225 (Pordata, 2020). Em rigor, o número de pessoas idosas é mais expressivo, porque o número de crianças/ jovens e pessoas em idade ativa é tendencialmente menor.


INTERVENÇÃO SOCIAL COM IDOSOS

(1) A intervenção social com idosos: A atual morfologia social obrigou as famílias a solicitar ao setor social ajuda, com elevada expressão às respostas sociais do tipo Centro de Dia, Serviço de Apoio Domiciliário e as Estruturas Residenciais para Idosos. Nestas organizações é desenvolvido, na maioria das vezes, um trabalho meritório e consentâneo com os pressupostos do EAS;


(2) Os métodos e técnicas: Diariamente desenvolvem-se procedimentos, uns mais alinhados com os atuais desafios do EAS que outros, é certo, que visam promover a qualidade e o bem-estar desta população;


(3) A força dos profissionais: Muitos são os profissionais de excelência que todos os dias “vestem a camisola” (por exemplo: interventores sociais, profissionais de saúde e auxiliares de ação direta) que representam um setor tantas vezes abnegado pela comunidade política e social;


(4) Paternalismo: Não sendo generalista, pois seria uma tremenda injustiça aos praticantes de boas-práticas, mas muitas são as instituições que deliberadamente tratam as pessoas idosas como crianças, como “coitadinhos”. Trata-se de “idadismo”, termo este que é utilizado para dar conta do fenómeno discriminatório face à idade, sendo este, o “ismo” mais aceite e institucionalizado do mundo;


(5) Ausência de políticas de participação ativa: Nesta fase, como noutras, é extremamente relevante que os profissionais sejam transparentes e verdadeiros com os idosos, na exata medida em que estamos a contactar com adultos e não, como comum e erroneamente se considera, com crianças que não refletem nem conseguem estar cientes da realidade que os rodeia, pelo que é fundamental que as políticas de participação se tornem uma realidade em contextos gerontológicos, sob pena de estarmos a alimentar junto das pessoas idosas sentimentos de inutilidade e baixa autoestima;


ORGANIZAÇÕES

(1) As decisões institucionais: Na maioria das vezes, centram-se apenas na espontaneidade e na experiência da prática, deixando para segundo plano (isto é, um plano mais longínquo) a produção científica por se considerar que esta é demasiado abstrata;


(2) As medidas paliativas e curativas: Prova-se agora que medidas populistas, avulsas e sem consistência são fantasiosas que roçam no crime de negligência e desrespeito;


(3) O desinvestimento e fragilidade no setor social: A debilidade, essa que decorre, entre outras, de decisões (centrais e locais) centradas em medidas puramente economicistas e que desvalorizam o capital humano;


(4) A inexistência de reconhecimento: Aos profissionais que diariamente acrescentam vida à vida das pessoas idosas, escasseiam práticas, medidas e louvores que tanto beneficiariam uma classe, por décadas e décadas desvalorizada;


(5) A carência de formação adequada aos profissionais: Capaz de contrariar práticas ainda débeis e, nalguns casos, primitivas.


De tudo isto há a acrescentar que resiste a certeza de quão adultos são as pessoas idosas ao invés de crianças como tantos fazem crer. De tudo sobra a certeza da importância das respostas sociais de provisão do cuidado às pessoas idosas e do valor e coragem dos profissionais que acrescentam vida à vida daqueles que acrescentaram e acrescentam algo à sociedade. Disto dever-se-ia tornar uma verdade de La Palice o facto de as pessoas idosas serem Pessoas, mesmo em tempo de pandemia.


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